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27.5.09

No corredor

Nina respira fundo, se concentra e, olhos fechados, enfia a chave na fechadura. Abre a porta num supetão de taquicardia, numa efusão de congelado-sorriso-social-semi-histérico sem esquecer – isso é por demais importante - , sem esquecer que tem que chegar de uma passada só até a lixeira, imaculada. E... ai, que susto!

Ele está lá. Descalço, cuecão e sem camisa. Que peitoral, ela pensa. Faço um estrago num desses.

Ele ri, meio constrangido, meio jogando charme. Não é amor, é esporte. Não é sexo, é esporte. Ela segura a gata numa mão, três sacolas na outra e o chaveiro no mindinho da mão esquerda. A mão que segura a gata. Só então ele percebe que está só de cueca. Ela de camisolinha. No corredor, na frente da porta do síndico.

- Quer uma ajuda?

“Quero. Me ajuda a tirar a camisola, depois me ajuda a arrancar a calcinha e aí me ajuda a entender o que é sexo selvagem.”

- Não, obrigada. Você é muito gentil.

- Tem certeza? Qualquer coisa... estou aqui – insiste ele, em franco discurso direto. Direto para os peitos dela.

Ela percebe a cueca. Ele, a camisola.

Rápido constrangimento. Mas o difícil mesmo é manter a língua dentro da boca e não propor:

- Sua casa, eu preparo o jantar, você abre o vinho. Hoje a gente brinca. Amanhã é outro dia.

“Que peitão, que bundão, que tes...”

- Olha, na verdade agradeço se você capturar a gata, que fugiu escada acima.

Ele captura a gata que fugiu escada acima. Na devolução, olhos nos olhos, qual é o seu nome mesmo?

- Pablo, sou argentino. Ninguém é perfeito – e sorri, com aquela boca perfeita.

- Então boa noite.

- Boa noite, então. Dorme bem com a gatinha.

- Dorme bem.

Fecham as portas lentamente. Ela mordendo os lábios sem perceber. Ele com a boca aberta, sem reparar. Hoje tem insônia no prédio.

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