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22.2.06

O Novo

Sístole, assístole
Tum-tum
Tum-tum
Coraçãotaquicardia

Mas isso,
Isso foi ontem...

Hoje, quando te vê
Ele já nem bate

Apenas um leve pulsar delicado,
Doce, tranqüilo e discreto.
Por outro.

20.2.06

Um dos Desvarios da Patrícia - Patrícia Reis

O homem velho tinha cabelos brancos e desalinhados.
As linhas do rosto também eram desalinhadas, e o olhar,
ah, o olhar era completamente desalinhado.

Andava em linha reta, muito embora cambaleante, muito embora frágil, muito
embora
parecesse que nem andava. Parecia era que o mundo
passava assombrado do seu lado, e contra,
como um vento, ou um inverno.

E seus olhos se dirigiam para o nada, muito embora olhassem para todas as
direções, enquanto
enquanto ele praguejava.

Das beiradas o velho enxergava:
tudo: o meio-fio,
a morte inteira.

Para receber os textos da Patrícia é só escrever pra patrícia@lapisraro.com.br com o subject Quero receber os desvarios.

16.2.06

Paraeles

Paraty, não para mim
Para eles, não para nós

Paraty, com sua poesia construída
Me expulsa
Me agride
Esse lugar não me pertence

Devolvo os desaforos
Deixando em cada pedra
Ou fragmento de terra do centro histórico
Um pouco de mim

Fios de cabelo
Pedaços de unhas ruídas
Cutículas arrancadas a dentadas
Fazendo gotejar o sangue

E o sangue se mistura a terra
Estou vingada
Paraty e eu agora somos uma só

Deixo ali minha marca
Meu DNA
Meu sangue literal

Faço o mesmo na cidade dos locais
Na Paraty de verdade
Que não atrai festivas, jornalistas ou turistas
A Paraty pária, vergonha
Subúrbio abortado do Rio

Mas a cidade entende e entra no jogo
E começa a me devorar

Consome meu sono
Rouba-me o calor do corpo
Devora minhas energias

Deixa apenas
Propositalmente
Uma certa melancolia

Angústia
Tristeza
Apatia
A cidade me expulsa

Guardo de lá apenas
Beijos roubados
Olhares furtados
Batimentos acelerados
E uma certa falta de ar

Pequenas transgressões
Públicas, íntimas e secretas

Apenas nós, transgressores
E a cidade sórdida, cretina
Apenas nós sabemos

Mas a cidade não pode falar

15.2.06

Soneto - José Aloise Bahia

Eu, olho-me no espelho oval da parede,
Procuro detalhes desta minha presença.
Tento achar em minha verdadeira aparência
Ainda atraente, sentir algum contentamento
No limiar da idade estampada no rosto:
Sutilezas, algum sulco ao redor dos olhos,
Que faz o corpo pedir azul kleiniano e branco,
Deixando-me satisfeito, na expectativa, entregue.
Mas não pensem que é uma mudança radical
O que se passa em minha proposta pessoal,
Esta tentativa de ficar mais jovem e refeito,
Bonito pra mim mesmo. Prestem bem atenção:
A razão suficiente da minha imagem refletida
Demonstra o prazer em vestir as cores do céu.

Mais José Aloise Bahia em Cronópios

14.2.06

Em casa

Caos, desequilíbrio, sangue em ebulição:
Estou em casa.

Thanatos

Lânguidamente entrego-me a Eros e Thanatos
Criaturas onipresentes e inevitáveis

O gozo é bom
O gosto é quente
E o tempo se perde

Não quero acordar

O Nu, a Vergonha e a Hipocrisia

Só temos duas coisas que ninguém pode nos roubar, que são unicamente nossas: nosso corpo e nossos pensamentos. E o corpo é a nossa parte tangente nessa engrenagem que é a natureza. É funcional e é estético.Fala sobre quem somos, fala o que estamos sentindo. Se expressa.

Portanto, não há nada de ridículo na sua exposição se ela não é gratuita, se existe um objetivo que não alimentar o próprio ego. Aliás, acho que não há nada de ridículo em sua exposição nunca.

E ainda tem o grande barato de ser um instrumento de mistério, de sedução... E o instrumento de perpetuação do homem como espécie e como filosofia.

Ou seja, o corpo, é vida.

12.2.06

Momento Mulherzinha no Domingo


Porque às vezes, só subindo no salto alto.

Anunciação - Alceu Valença

Na bruma leve das paixões que vem de dentro
Tu vens chegando pra brincar no meu quintal
no teu cavalo peito nu cabelo ao vento
E o sol quarando nossas roupas no varal
tu vens
tu vens
eu já escuto os teus sinais
A voz do anjo sussurou no meu ouvido
e eu não duvido já escuto os teus sinas
que tuvirias numa manhã de doming
Eu te anuncio nos sinos das catedrais
Tu vens
tu vens
Eu já escuto os teus sinais

Domingo no Parque - Gilberto Gil

O rei da brincadeira - ê, José
O rei da confusão - ê, João
Um trabalhava na feira - ê, José
Outro na construção - ê, João
A semana passada, no fim da semana João resolveu não brigar
No domingo de tarde saiu apressado
E não foi pra Ribeira jogar
Capoeira
Não foi pra lá pra Ribeira
Foi namorar

O José como sempre no fim da semana
Guardou a barraca e sumiu
Foi fazer no domingo um passeio no parque
Lá perto da Boca do Rio
Foi no parque que ele avistou
Juliana
Foi que ele viu
Juliana na roda com João
Uma rosa e um sorvete na mão
Juliana, seu sonho, uma ilusão
Juliana e o amigo João

O espinho da rosa feriu Zé
E o sorvete gelou seu coração
O sorvete e a rosa - ô, José
A rosa e o sorvete - ô, José
Oi, dançando no peito - ô, José
Do José brincalhão - ô, José
O sorvete e a rosa - ô, José
A rosa e o sorvete - ô, José
Oi, girando na mente - ô, José
Do José brincalhão - ô, José

Juliana girando - oi, girando
Oi, na roda gigante - oi, girando
Oi, na roda gigante - oi, girando
O amigo João - João

O sorvete é morango - é vermelho
Oi, girando, e a rosa - é vermelha
Oi, girando, girando - é vermelha
Oi, girando, girando - olha a faca!
Olha o sangue na mão - ê, José
Juliana no chão - ê, José
Outro corpo caído - ê, José
Seu amigo, João - ê, José

Amanhã não tem feira - ê, José
Não tem mais construção - ê, João
Não tem mais brincadeira - ê, José
Não tem mais confusão - ê, João

8.2.06

Prato Feito

Almoço baratas
Janto ratos
Engulo sapos

Quem serve? Eu

Lucy in the sky with diamonds
Mentira, Falácia.
Lucy in the sky with evil pills in her mind

Me alimento do pó
Que os cupins fazem do meu cérebro
Me nutro, me regozijo e celebro

3.2.06

Anjo Caído do Inferno - Ota




Menina, você nasceu
da pulada de cerca
de algum querubim.

Daí essa mistura louca
que você não sabe o que é
mas eu já decodifiquei.

A genética te entrega:
auréola, rabo pontudo,
os chifres você deixa pra mim.

Seu incêndio pessoal
é por que você não sabe
como apagar esse fogo.

Eu estava disposto
a descer ao Inferno
pra te resgatar.

Mas nem foi preciso:
você aprontou tanto
que foi expulsa de lá.

2.2.06

Orquídea

Minha pele se rasga da nuca ao cóccix
Dando liberdade a uma gigantesca lâmina
De cartilagem e penugem.

Meu peito se rasga
E dele sai em voo tumultuado
Um enxame de vespas
Que zunem, zunem, zunem

Minhas veias ultrapassam o limite
Das pernas e se tornam raízes grossas
E firmes, que me prendem ao solo.

Nesse momento, meu tronco se solta
E alço voo, com meus braços que já viraram asas.

Do alto observo o bailar das nuvens
E o gorjeio dos automóveis

As penas das asas se soltam
Uma a uma
Transformando-se em pétalas de orquídea
Que caem docemente pelo chão.