- Vou dar um alô com o Antônio ali no Boteco.
- Mas o jantar está quase pronto...
- Cinco minutinhos...já tô voltando.
- A sopa vai esfriar!
A porta bateu. Ela ainda ouviu o assovio sumindo no corredor.
Não foram cinco minutinhos. Não foram cinco horas. Aliás, não foram nem mesmo cinco dias. Já se passava quase uma semana e ele não havia voltado, nem um telefonema. O Antônio, quando cruzava com ela pela rua, olhava para o chão e atravessava para o outro lado.
"Ah, mas isso não vai ficar assim" pensava ela com raiva, enquanto açoitava a pia com o desentupidor. "Isso não vai ficar assim não!"
- Mãe, tira esse prato da mesa, isso já tá nojento.
- Deixa o jantar do seu pai aí!
Há seis dias a mesa continuava lá, intacta, impassível. O prato de sopa em cima, já com uma cor duvidosa.
- Mãe, já pensou que ele pode ter morrido? Sofrido um acidente?
- Cala a boca menino!
De repente os dois ouvem o assovio. Em seguida o barulho das chaves na porta. E ele entra, ainda assoviando, o cigarro pendurado no canto da boca e uma bisnaga em baixo do braço:
- O que é que tem pra jantar?
O filho nem pensou, voou para o quarto. Ela respirou fundo, se controlando. "Não vou dar esse gostinho a ele não":
- Sopa. Já está pronta meu bem. Seu prato já está até feito. Há seis dias - ela sibila.
Ele não se abala. Apaga o cigarro, bota o pão na mesa, puxa a cadeira. Senta relaxado, jogando displicente o guardanapo no colo. Olha para a sopa. Cheira. Levanta na direção do banheiro e fala, enquanto tira a roupa pelo caminho:
- Tá fria, meu bem. Esquenta por favor.